A TGHN reúne, regularmente, painéis de especialistas de diversas partes do mundo para compartilhar suas iniciativas de pesquisa e discutir as prioridades de pesquisa que os futuros ensaios e estudos sobre COVID-19 deverão abordar.
Em cada um destes workshops, um tema diferente é debatido. Até agora já conduzimos sessões em inglês, português, espanhol e francês. Clique aqui para acessar todos os workshops virtuais realizados e os programados.
Este espaço surgiu em resposta ao interesse dos participantes do Workshop Virtual TGHN em português sobre a resposta dos países lusófonos frente à epidemia de COVID-19 (vídeo e resumo abaixo).
Resumo
Resposta da Fiocruz à Pandemia de Covid-19
Dr. Gustavo Matta - Pesquisador em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Desde janeiro, a Fiocruz vem monitorando os casos de COVID-19 na China e estruturando suas linhas de resposta à epidemia. Atualmente, conta com 5 eixos de atuação em articulação com a área técnica do Ministério da Saúde.
- Diagnóstico: treinamento de laboratórios em 27 estados brasileiros; produção de 1 milhão de kits para diagnostico com entrega prevista para abril
- Assistência especializada: unidades Fiocruz foram as primeiras unidades a receber os casos no Rio de Janeiro; construção de centro hospitalar com 200 leitos semi-intensivos e de UTI; acompanhamento de gestantes e recém nascidos
- Pesquisas e ensaio clínicos: coordenará o Solidarity Clinical Trial da OMS, em que estarão envolvidos hospitais em 12 estados brasileiros; criação do Observatório COVID-19, que tratar de temas prioritários sobre a doença
- Formação de profissionais de saúde: cursos no campus virtual; capacitação de técnicos em saúde de 9 países das AL; assinatura de acordo para envio de equipe de treinamento aos países lusófonos da África
- Comunicação e informação: campanha de comunicação em saúde baseada em dúvidas dos moradores de comunidades vulneráveis do Rio de Janeiro; estabelecimento do tele-coronavirus, atendimento por telefone realizado por alunos de medicina do 5º e 6º ano para triagem à distância de pacientes com sintomas de COVID-19
Rede Covida – Ciência, informação e solidariedade
Dr. Mauricio Barreto - Professor Emérito da Universidade Federal da Bahia e Pesquisador da Fiocruz
A rede Covida - Ciência, Informação e Solidariedade foi criada a partir do CIDACS (Centro de Integração de Dados e Conhecimento para a Saúde) da cidade de Salvador-BA, por meio de uma chamada para colaboradores voluntários. Essa rede foi organizada em uma semana e já conta com a participação de 150 colaboradores da Fiocruz e da UFBA, dentre eles posdocs, doutorando, bolsistas etc. O foco da Covida é a geração, em tempo real, de informações de qualidade baseadas em evidência. Ela está organizada em 5 grupos: Área de visualização de dados, Epidemiologia/dados, Modelagem matemática e Comunicação. A área de Síntese de evidências científicas conta com dois pós-doutores que realizam, toda manhã, a coleta e síntese de novas evidências científicas geradas e compartilhadas pela internet. Esse material serve de base para todas as outras áreas da rede, de forma que todos trabalham com as mais recentes e relevantes evidências científicas. Um dos focos da rede é a produção de notas para combater notícias falsas e promover notícias verdadeiras relevantes. Outro produto da rede foi a produção do painel COVID-19 (http://painel.covid19br.org/), cujos dados chegam ao nível municipal. Esse painel, além de conter os dados oficiais de casos confirmado e óbitos, também conta com um modelo matemático que estima o número de casos que ocorrerão na semana seguinte. Esse modelo é atualizado automaticamente a medida que novos dados são disponibilizados. Ainda, o grupo de modelagem matemática também está elaborando um modelo que possa ser utilizado para estimar o impacto das medidas de contenção social, de forma a informar a tomada de decisão. Além dessas atividades, a rede Covida está participando ativamente de várias iniciativas na região Nordeste. Por exemplo, estão dando suporte organizacional e científico ao grupo de Salvador que fará parte do Solidarity Clinical Crial. Também formaram uma forca tarefa para investigar o impacto da vacina de BCG como potencial protetor ao desenvolvimento de COVID-19, em especial para os profissionais de saúde que estão atuando diretamente. Ainda, a rede está auxiliando governadores da região com apoio científico para a tomada de decisões. É importante destacar que todas essas iniciativas são conectadas à Fiocruz. Nesse momento, é importante lembrar que as diferenças regionais requerem que ocorra a descentralização das ações no Brasil, de forma que se estabeleçam grupos em vários lugares, mas sob uma coordenação central efetiva. Esse é um momento de colaboração e a generosidade das pessoas está facilitando muito a geração de soluções.
Estimativa do impacto da COVID-19 na grande São Paulo por modelagem matemática
Dr. Wildo Navegantes de Araújo - Professor de Epidemiologia da Universidade de Brasília
Apresentação de slides: clique aqui.
Essa epidemia está causando impactos inéditos à administração pública, como por exemplo diferentes instituições públicas se movendo rapidamente para ceder equipamentos, insumos e servidores da UnB ao sistema de saúde do estado, o que duplicou a capacidade de diagnóstico da rede de saúde do Governo do Distrito Federal. Isso traz também um grande desafio, que é a definição da forma apropriada de fazer a governança em uma situação como essa, em que muitos níveis da administração pública estão envolvidos. Hoje, apresento o trabalho de modelagem matemática realizado por pesquisadores da UnB, técnicos do Sistema de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (MS) e Organização Panamericana de Saúde, Escritório Brasil. Tínhamos feito a modelagem para monitorar a resposta à vacinação contra sarampo. E com a pandemia, rapidamente adaptamos para COVID-19 para guiar as ações iniciais do MS. Nesse trabalho, foi avaliada a situação da grande São Paulo, considerada a porta de entrada do SARS-CoV-2 no Brasil, em virtude do elevado tráfego em seus aeroportos internacionais. Além disso, essa metrópole possui muitas características populacionais semelhantes a Wuhan, China. Uma diferença importante é que a população de São Paulo é ainda mais densa que a de Wuhan. A importância dada à redução da velocidade de transmissão da doença se dá com o intuito de suavizar a curva epidemiológica, de forma que o número de doentes acometidos simultaneamente não ultrapasse a capacidade de resposta do sistema de saúde. Para isso, os governos locais passaram a tomar medidas indicadas pelo MS no sentido de contenção do contato social. No Brasil, cada governo local tomou as medidas que consideraram necessárias a seu tempo, já que a epidemia se iniciou em momentos distintos em cada estado. Essas medidas visam a redução da transmissão, principalmente, para os grupos mais vulneráveis e leva à grande pergunta: por quanto tempo essas medidas devem ser mantidas? Ainda, como deve ser feito em relação ao impacto econômico dessas medidas? Em relação ao modelo matemático, foi utilizado o conceito “R0”, ou taxa de reprodução de casos, que se refere ao número de pessoas suscetíveis que podem ser infectadas a partir de uma pessoa infectada, dentre outros parâmetros a partir de dados publicados por pesquisadores provenientes da China. Na modelagem matemática, utilizando-se de equações diferenciais, assumimos os componentes: susceptíveis, expostos, infectados e recuperados. Assumiu-se o valor de 100 % de susceptíveis, já que o vírus não circulava antes na população. O grupo de infectados pode ser subdividido em leves, graves ou críticos. Os graves e os críticos assumimos que param de transmitir para a população quando hospitalizados. Utilizando os valores observados na China para esses parâmetros, disponíveis no dia 9 de março de 2020, foram criadas as matrizes de contato por faixa etária e estimados os números de casos acumulados em SP em 30 dias e 60 dias após a confirmação do primeiro caso. É importante ressaltar que esse modelo representa o cenário em que não houvesse nenhuma intervenção efetiva de tratamento e que não fossem tomadas medidas de contenção social, com o intuito de mostrar ao MS o tamanho do problema que ele teria que administrar de forma efetiva. Ainda por esse modelo, foi possível observar que apenas a partir de aproximadamente 50% de redução de contato social começaria a se observar um efeito importante na redução do número de casos novos. A série de dados da China no começo da epidemia era muito irregular poque os dados eram reportados apenas semanalmente. Quando o sistema de vigilância percebeu a epidemia, passou a atuar de forma diária. Outro ponto a ser destacado é que os jovens também adoecem e são importantes na transmissão da doença. No Brasil e nos EUA já é possível observar isso, de forma mais acentuada que em países mais envelhecidos como Espanha e Itália. Ainda, o modelo mostra que, se não fossem feitas medidas de contenção, seria necessário que o sistema de saúde absorvesse cerca de 100 mil pessoas doentes nos 100 primeiros dias da epidemia. A partir desse trabalho, o grupo está desenvolvendo agora um modelo de reprodução tempo dependente, já que variáveis como o comportamento social e as medidas de contenção do governo estão mudando ao longo do tempo. Observando os dados atuais, já se observa um movimento de inflexão do R0, o que não se sabe ainda se por reflexo das medidas de distanciamento social, das variações na forma de reportar casos ou da incapacidade de diagnóstico. Esse trabalho está disponível em: https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.03.14.20035873v1 .
Como estamos respondendo ao desafio de pesquisa do COVID-19?
Dra. Jocelyne Vasconcelos - Chefe do Centro de Investigação e Saúde de Angola (CISA)
Apresentação de slides: clique aqui.
O Ministério da Saúde de Angola tem trabalhado desde 2006 para estabelecer um Sistema de Vigilância de doenças respiratórias, com foco em determinar a sazonalidade e variabilidade dos patógenos presentes no país. Ainda, esse sistema tem como objetivo oferecer apoio na resposta à epidemias e alertar sobre possíveis novas possíveis epidemias. Para administrar os desafios apresentados pela COVID-19, foi criada uma comissão interministerial de forma a garantir uma reposta coordenada e multidisciplinar. Foram decretadas medidas de vigilância nos pontos de entrada do país e esforços de disseminação de informações estão sendo feitos tanto nas áreas urbanas quanto nas áreas rurais, nesta última por meio de agentes comunitários que trabalham em parceria com os líderes comunitários e as igrejas locais. O estado de emergência foi decretado quando dois casos foram confirmados no país. A partir desse momento, as pessoas que entraram em Angola vindas de países com transmissão comunitária foram colocadas em quarentena obrigatória, em espaços institucionais criados para recebê-las. Pessoas que tiveram contato com esses viajantes foram submetidas à quarentena domiciliar. Em relação ao papel do CISA, mesmo não fazendo parte da comissão interministerial, se juntou ao Instituto Nacional de Investigação em Saúde (responsável por conduzir a testagem laboratorial dos casos suspeitos) e disponibilizou pessoal técnico para ajudar na equipe de resposta, tanto no âmbito de diagnóstico, quanto epidemiológicos e de cuidado direto em saúde nas unidades hospitalares. Em relação às lacunas observadas para a pesquisa de COVID-19, não há espaço para os pesquisadores porque eles não possuem acesso às unidades hospitalares nem às instituições responsáveis pela resposta, ou seja, não foram incluídos na ação contra a epidemia. Isso ocorre porque todos os esforços do governo têm sido no sentido de garantir a vigilância e o manejo de casos ativos, o que está consumindo todo o tempo, espaço e recursos do país. Dessa forma, seria muito útil para a resposta de Angola ao COVID-19 que centros de outros países disponibilizassem ferramentas online para treinar as equipes técnicas, em tópicos como comunicação e modelagem matemática, para que essas equipes pudessem dar um maior apoio à resposta.